A saúde no trabalho dos astronautas.
Fórum AT chama a atenção para aspecto que pode passar em branco para o leitor.
A importância do acompanhamento em tempo real - da situação de saúde de trabalhadores em atividades novas ou com dimensões desconhecidas e ou de incerteza. Trata-se do trabalho que envolve busca de identificação de impactos que o conhecimento existente permite antecipar, ou pensar (parte deles destacados no texto abaixo) e também sobre o que ainda não se sabe. Ou seja, buscar o que sabemos que não sabemos! Quais serão os protocolos de busca atualmente adotados para esses trabalhadores - astronautas?
E as condutas para as diferentes situações? por exemplo, as perdas musculares e ósseas. Ou para a agressão ao nervo óptico e outras lesões oculares? Há estratégias de prevenção ou de minimização de impactos sendo adotadas? como agem na atmosfera sem gravidade? As questões possíveis são muitas.
E a pergunta que não quer calar. Já pensaram se os mesmos cuidados fossem adotados para todos os trabalhadores?
Quantos milhões de trabalhadores temos hoje em exposições provenientes de inovações tecnológicas e organizacionais? ou atuando em situações que permitem interações entre múltiplos compostos químicos, mudanças no ambiente físico, climático, ou outros. Aliás muitos até negados a princípio. O que já se aprendeu a esse respeito no que se refere às estratégias de monitoramento ou vigilância de saúde nessas situações?
Adendo Ildeberto 06 de abril
Comentário do Colega Heleno Correa a essa postagem, em um grupo de Zap suscita novas questões éticas, jurídicas, políticas sobre os temas afins:
"Nem estavam longe do planeta. Estavam presos na órbita com os países de origem mais preocupados em fazer guerra do que em resgata-los. Foram fritados na radiação espacial durante oito meses bebendo agua reciclada da própria urina e teriam morrido vendo a terra embaixo igual ao degolado da JBF"
O professor Heleno tem razão ao apontar que nesse caso houve decisão - escolha racional - gerencial estratégica de lidar com variabilidade da atividade de modo que prolongou a duração da exposição dos trabalhadores a múltiplos riscos, conhecidos e desconhecidos. Na prática, a saúde e segurança dos trabalhadores foi assumida como menos importante do que os custos de uma operação emergencial para resgate dos astronautas. Aliás a inexistência de plano B para o tipo de incidente ocorrido na atividade era conhecido. Quem toma esse tipo de decisão? Como o ponto de vista da saúde e da segurança dos trabalhadores são considerados nessas decisões?
Como essas questões estão sendo consideradas na legislação vigente?
Que venham mais questões para o debate,
Acesse o link do texto para ver o texto com todos os links do original ativados. (versão pdf aqui)
Em junho de 2024, os astronautas da NASA Butch Wilmore e Suni Williams chegaram à Estação Espacial Internacional para uma missão de 8 a 10 dias. No entanto, problemas com a nave espacial Starliner atrasaram seu retorno até março de 2025, 286 dias depois.
O que começou como uma curta estadia se transformou em mais de nove meses de microgravidade, o que pode ter efeitos profundos no corpo dos astronautas: atrofia muscular, perda de densidade óssea, alterações cardiovasculares, problemas de visão e estresse.
Era assim que eles eram antes de serem lançados ao espaço na nave Starliner:
E era assim que eles estavam quando retornaram na nave Crew Dragon que os resgatou:
Suni Williams ao retornar para a Terra - Imagem: Nasa/SpaceX
Butch Wilmore ao retornar para a Terra - Imagem: Nasa/SpaceX
Décadas de envelhecimento
Tanto a NASA quanto a ESA estudaram extensivamente os efeitos da exposição ao espaço e à microgravidade no corpo humano. Uma das mais comuns é a perda de massa muscular e óssea.
Na Estação Espacial Internacional, não há gravidade para forçar os músculos e ossos a trabalhar para sustentar o corpo, então os tecidos começam a enfraquecer devido ao desuso.
Os astronautas perdem cerca de 1% da densidade mineral óssea a cada mês que passam no espaço. Seus músculos, especialmente os das pernas e costas, acabam atrofiando, e é por isso que eles têm dificuldade para ficar de pé após pousar na Terra.
Para atenuar esse efeito, os membros da tripulação da ISS passam por rotinas de treinamento rigorosas: duas horas por dia na esteira, bicicleta ergométrica ou fazendo exercícios de resistência.
Mas isso não é suficiente: um estudo publicado na Scientific Reports revelou que uma estadia de mais de seis meses no espaço pode causar perda óssea equivalente a décadas de envelhecimento na Terra
Os astronautas, geralmente, correm maior risco de fraturas devido à redução da resistência dos ossos, semelhante ao que ocorre com os adultos mais velhos. Para Butch e Suni, com uma perda óssea esperada de 9-10%, a NASA estabeleceu um programa intensivo de reabilitação física de 45 dias.
Ainda assim, para muitos astronautas, a recuperação é incompleta mesmo um ano após o retorno. Leva de dois a quatro anos para que os músculos de uma pessoa recuperem totalmente sua força original após uma missão prolongada.
Efeitos da microgravidade
Ao flutuar, os fluidos corporais são redistribuídos para a parte superior do corpo, pois a gravidade não os puxa em direção aos pés. Isso causa o rosto inchado característico visto nos astronautas a bordo da ISS. Mas também tem consequências internas: o corpo interpreta o excesso de líquido como resultado e reduz o volume total de sangue.
Com menos volume de sangue e sem necessidade de bombear contra a gravidade, o sistema cardiovascular relaxa. O coração pode afinar suas paredes musculares e a pressão arterial tende a cair. Ao retornar à Terra, esse ajuste às vezes causa tontura ou até desmaio (hipotensão ortostática), pois a gravidade puxa o sangue de volta para as pernas e leva tempo para o corpo se reajustar.
Os astronautas geralmente usam trajes de compressão especiais ou aumentam a ingestão de líquidos e sal antes da reentrada para minimizar esses sintomas. Ainda assim, é comum que eles permaneçam sentados, como aconteceu com Butch e Suni quando desceram da Crew Dragon, esperando seus corpos se reequilibrarem.
Outro efeito físico importante descoberto nas últimas décadas de exploração espacial é a chamada Síndrome Neuro-Ocular Associada ao Voo Espacial (SANS). Sem a força da gravidade, o deslocamento do fluido em direção à cabeça pode aumentar a pressão intracraniana, o que, por sua vez, deforma levemente os globos oculares e comprime o nervo óptico.
Muitos astronautas em estadias prolongadas relatam alterações na visão: eles podem desenvolver hipermetropia temporária (dificuldade de enxergar de perto), o que significa que seus olhos mudam de formato sob pressão interna.
Em missões de longa duração, mais de 70% dos astronautas sofreram de SANS. O astronauta da NASA Scott Kelly, que passou um ano no espaço e mais tarde foi comparado ao seu irmão gêmeo Mark, desenvolveu edema do nervo óptico e alterações na retina.
A ausência prolongada de gravidade e o ambiente fechado da ISS também afetam o sistema imunológico dos astronautas, causando alterações na distribuição de glóbulos brancos e na expressão de certos genes imunológicos em resposta ao ambiente extremo.
Paradoxalmente, viver no ambiente estéril da ISS pode enfraquecer a resposta imunológica ao longo do tempo: ao não ser exposto a tantos patógenos cotidianos, o sistema imunológico baixa a guarda. Erupções cutâneas, alergias e até mesmo reativação de vírus latentes (como herpes) (https://www.minhavida.com.br/saude/temas/herpes-simples) foram observadas devido à diminuição das defesas.
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Radiação e nove meses de estresse
Ao mesmo tempo, os astronautas em missões de longo prazo acumulam exposição significativa à radiação solar e aos raios cósmicos, sem a atmosfera como escudo protetor.
No entanto, uma estadia de nove meses está dentro dos limites aceitáveis da NASA, já que a ISS orbita a Terra a apenas 400 km de altitude. Danos celulares serão um problema muito maior em futuros voos espaciais de longa duração para a Lua e Marte.
Mais preocupantes são os efeitos psicológicos do confinamento prolongado em uma estação espacial que orbita a Terra 16 vezes por dia. O tempo não é um problema porque a ISS segue um cronograma rigoroso baseado no Horário de Greenwich. Mas a falta de luz natural e os ciclos de escuridão podem perturbar os ritmos biológicos, causar privação de sono (https://www.minhavida.com.br/saude/temas/dificuldade-para-dormir) ou prejudicar o desempenho cognitivo.
No final, o que pode cobrar mais caro é a experiência psicológica de trabalhar em um ambiente confinado, longe da família e com poucos colegas de diferentes países. No caso de Butch Wilmore e Suni Williams, essa situação foi agravada pela incerteza: sua missão foi estendida devido a problemas técnicos, por muito tempo sem uma data clara de retorno.
A boa notícia é que a maioria das mudanças corporais no espaço não são permanentes. Aproximadamente 95% das alterações fisiológicas retornam ao normal dentro de algumas semanas após o retorno.
Os astronautas, geralmente, recuperam o equilíbrio e a capacidade de andar em poucos dias, a distribuição de fluidos se normaliza rapidamente e os distúrbios do sono tendem a melhorar à medida que eles restabelecem os ciclos ligados à Terra.
Quanto às consequências psicológicas, os astronautas de carreira são escolhidos por sua predisposição a atuar em situações de alto estresse sem ficarem nervosos. É o seu trabalho e sua paixão. Eles não recebem horas extras, mas sempre que têm oportunidade estão dispostos a retornar ao seu lugar favorito: o espaço.
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