Posição importante do Instituto Walter Leser contra a atribuição de culpa assumida em campanha do governo sobre o Burnout. A intenção era boa mas o produto saiu com grandes problemas.
Vejam na Nota Técnica escrita pelo GT do Instituto comentários sobre as diferentes peças publicitárias da campanha criada pelo Ministério.
Saúde do Trabalhador. O problema não é você
Grupo de Trabalho de Saúde do Trabalhador (do Instituto Walter Leser) reage a abordagens individualistas e focadas no comportamento do trabalhador, ao mesmo tempo em que esconde a responsabilidade da empresa
09 de fevereiro de 2024
O aumento da visibilidade e dos debates públicos a respeito de saúde mental dos trabalhadores pode ter resultados nefastos com a abordagem do problema escolhida, inicialmente pelas empresas de comunicação e surpreendentemente, pela área de comunicação das instâncias do governo que operam na área. O foco no indivíduo e o tratamento da informação como "orientações para alcançar o bem estar" esconde o impacto da forma como o trabalho está organizado, um problema apontado pelos especialistas e estudiosos há mais de 20 anos e que jamais foi reconhecido e muito menos, enfrentado. "É o mesmo que tentar controlar o cólera sem fazer saneamento básico na comunidade afetada", argumenta o psicólogo Carlos Carrusca, integrante do GT Saúde do Trabalho do Instituto Walter Leser.
Depois de encontrar diversos materiais de divulgação do Ministério da Saúde nas redes sociais com esta abordagem, o GT Saúde do Trabalhador (Fórum AT acrescenta: GT do Instituto Walter Leser) redigiu e enviou uma Nota Técnica para todas as instâncias envolvidas com a questão.
As imagens e textos, organizados como um "carrossel" nos canais do Governo no Instagran, estão sendo divulgados como parte da campanha "Janeiro Branco", de combate ao burnout, o estress agudo e perigoso, que pode ser fatal e que afeta um número cada vez maior de trabalhadores de forma generalizada.
"Já ouviu falar na Síndrome de Burnout? Ela é resultante da relação entre a pessoa com o seu meio de trabalho e é desenvolvida
gradualmente", diz um dos cards do carrossel publicado no canal de Brasília.
"O tratamento é feito com acompanhamento psicológico, podendo haver intervenção medicamentosa", diz outro card, relativo ao tratamento. A empresa é citada em um quadro logo abaixo dessa indicação, de forma dúbia e que mais confunde do que explica: "Não se esqueça: o tratamento também deve acontecer no trabalho". Isso quer dizer que o trabalho deve ser alterado? Ou que o trabalhador deve se tratado enquanto está no trabalho?
A Nota Técnica argumenta que essa abordagem vai contra inclusive à principal publicação técnica sobre doenças relacionadas ao trabalho do próprio Ministério da Saúde, que destaca a necessidade de se distinguir o burnout, resposta ao estresse laboral crônico, de outras formas de estresse. Com relação ao tratamento sugerido, alerta que ele pode piorar o quadro, por ser insuficiente para alterá-lo:
"Nos estudos e na prevenção do burnout, há que se buscar, sempre, por aspectos de origem laboral, como, por exemplo, situações de alta demanda; incompatibilidade entre as metas exigidas e a possibilidade de sua realização; exigência de envolvimento emocional; intensa pressão; cobranças sistemáticas e de rigor excessivo ; exiguidade de tempo para realização das tarefas e por outro lado, sistemas de avaliação individualizados e organizados com base em critérios que mantêm sempre uma parcela de trabalhadores abaixo das expectativas avaliativas, de forma a impulsionar a competição no ambiente laboral; precariedade de recursos materiais, de apoio social e fragilidade dos coletivos laborais para fazer frente às demandas", diz.
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